sábado, 23 de janeiro de 2010

damasco

foi hoje de manhã.
quando abri um iogurte de damasco. daqueles com pedaços inidentificáveis de fruta.
coloquei o pote sobre a pia e joguei a tampinha de metal no lixo reciclável.
olhei pro potinho.
eu sempre tive nojo de pias.
meu pai costumava limpar lulas nela quando eu era criança e eu ainda vejo as tripas espalhadas pelo mármore.
é o tipo de coisa que nem álcool e fogo consegue limpar.
senti inveja do potinho de iogurte.
uma inveja absurda por ele ser de plástico e, óbviamente, mais resistente ao tempo do que eu.
imaginei uma mórbida corrida pútrida entre o meu cadáver e o potinho.
o potinho venceria. não havia dúvida.
eu estava tão vulnerável...
aos 36 anos, numa batalha infinita contra nunca-saberemos-o-que, ela começou a chorar no meu sofá.
servi-lhe café, desejando secretamente que a cena acabasse logo.
ela era geniosa, certamente, mas perdera-se na angústia de fazer escolhas não-convencionais.
agora estava aí, com inveja de um potinho plástico, o que seria poeticamente gracioso, salvo o fatigar de suas crises metafóricas.
continuou a chorar, pulando de um assunto para outro e tentando, sem muito sucesso, amenizar a própria situação.
eu mesmo comecei a ter inveja do potinho de iogurte.

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