quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

o vazio

o vazio está.
pretende, deseja, mas não.
ainda que não preenchido, o vazio carrega ainda um anseio.
não cabe em si.
não põe em prática.
ele espera.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

o nada

era uma vez o nada, com suas infinitas possibilidades.
inclusive a de continuar nada.
aflito em pensar e tornar-se pensamento,
afogou-se em tanta liberdade.

domingo, 18 de janeiro de 2009

efeito ponte

quando a nuvem de gafanhotos se aproximou já não havia colheita a devastar.
no lugar do espantalho, estafermo.
era guerra retraída, silêncio incômodo.
como se a terra desistisse de suas crias e a gravidade não funcionasse por alguns instantes e toda aquela neblina verde começasse a flutuar docemente, sem zunidos, sem anseio.
apenas um breve rangido do eixo impediria o escavado tórax de sonhar.
e nesse exato momento, como que despertada pelo metal, a atração mútua dos corpos voltasse, e covardemente vencedora, a terra recolhesse os seus em golpe seco.
o tórax viria abaixo em estridente baque e a caelifera chuva tornaria novamente verde a plantação.

domingo, 11 de janeiro de 2009

vírussimilhança

toda vez que eu vou comentar no blog dela, as letras que me pedem para provar que sou uma pessoa me fazem lembrar os muitos números que eu sou.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

.me engana que eu gosto

a esperança é uma bruxa que te leva pela mão, passivamente, até sua velhice, onde você é um acomodado sem sonhos realizados.
só pra rir da tua cara.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

plastic.sun

o garoto volta à casa da vó e se depara novamente com as frutas de plástico.
- vovó, você que comprou isso?
- comprei, sim.
- por que?
- para enfeitar.
- de onde elas vieram?
- de uma árvore de plástico.
- árvore de plástico?
- sim. tão reluzente quanto seus frutos e flores.
- tem flores de plástico na casa da tia nena!
- sim, são da mesma árvore. só existe uma no mundo, sabe? por mais que os homens tentem plantar plástico por aí, ele jamais germinará em solo fértil.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

plastic.tree

reluzentes frutas de plástico inibiam a salivação dos presentes.
o garoto loirinho pergunta à mãe de onde aquilo vinha.
- a vovó comprou para enfeitar a mesa.
- por que ela não enfeitou com fruta de verdade?
- porque fruta de verdade estraga.
- mas ela podia comer antes de estragar, e comprar novas.
- a vovó não gosta muito de frutas.
- então por que resolveu enfeitar a mesa com elas?
- não sei. talvez porque bibelôs quebrem e flores precisem de cuidados.
- a vovó tem preguiça de cuidar de flores?
- sua vó já teve muita responsabilidade na vida, meu filho.
- mas é só pôr água de vez em quando!
- coma sua sopa.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

colecionáveis

caroços de cereja e dados.
minhas mais bem sucedidas coleções.
cicatrizes também, eu poderia dizer, mas seria demasiado poético.
além de mentira.
a coleção de long plays do meu pai triplicou essa semana.
doações.
triplicou a minha herança.
minha mãe só coleciona mortos.

domingo, 4 de janeiro de 2009

re.começar

janeiro recomeça gasto.
quantos anos tem um mês?
antigamente vivia tardes intermináveis.
corria na lama, tomava banho no tanque (ou na bacia), subia em árvore, alimentava tatu, parava a bicicleta com o joelho no asfalto.
mais adiante descobri a balada, a rave, a boate, a noitada, a discoteca, ou não importa o nome de qualquer lugar semi-escuro com música alta e adolescentes bêbados.
descobri a música eletrônica, a clássica, o rock'n'roll, o punk, a mpb, o samba, o samba-rock, o rap, o indie, o jazz, e nomes e nomes e nomenclaturas inúteis.
descobri lispector, hesse, carroll, nietzsche, sartre, schopenhauer, bukowski, drummond, anjos, leminski, quintana, sponville, poe, freud.
descobri lynch, bergman, almodovar, rocha, burton, allen, buñuel, kurosawa, tarantino, kubrick, hitchcock.
descobri ryden, picasso, magritte, miró, brown, escher, dalí, kandisnsky, banksy.
descobri são paulo, sorocaba, buenos aires, maringá, natal, porto seguro, santa catarina, belo horizonte, florianópolis, campo grande, ilha bela, barequeçaba, peruíbe, foz do iguaçu, salvador.
descobri fernando, janaína, simone, edson, kotsuka, bea, lia, andré, camila, arthur, julia, alessandra.
descobri que é possível viver sem carne, sem leite, ovo, queijo, lã, couro, mel.
descobri que nem a roupa nem a louça se lavam sozinhas.
em 20 anos descobri um pouco sobre mim.
e hoje os dias vão passando como dente de leão em ventania.