terça-feira, 14 de dezembro de 2010

thoreau

as obras dos grandes poetas não foram nunca lidas pela humanidade,
pois só os grandes poetas podem ler.
elas simplesmente têm sido lidas como as multidões lêem as estrelas,
de um modo astrológico,
e não astronômico.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

o maldito capítulo 28

"(...) that maybe it's time for us to end our story forever.
we were already separated, that was official, but there was still a window of hope left open that perhaps someday (maybe after my travels, maybe after a year apart) we could give things another try. we loved each other. that was never the question. it's just that we couldn't figure out how to stop making each other desperately, shriekingly, soul-punishingly miserable."

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

eu tenho um sentimento

everybody had a hard year.
everybody had a good time.
everybody had a wet dream.
everybody saw the sunshine.
oh yeah.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

venha, que o que vem é perfeição...

tua caminhada ainda não terminou...
a realidade te acolhe
dizendo que pela frente
o horizonte da vida necessita
de tuas palavras
e do teu silêncio.

se amanhã sentires saudades,
lembra-te da fantasia e
sonha com tua próxima vitória.
vitória que todas as armas do mundo
jamais conseguirão obter,
porque é uma vitória que surge da paz
e não do ressentimento.

é certo que irá encontrar situações
tempestuosas novamente,
mas haverá de ver sempre
o lado bom da chuva que cai
e não a faceta do raio que destrói.

tu és jovem.
atender a quem te chama é belo,
lutar por quem te rejeita
é quase chegar a perfeição.
a juventude precisa de sonhos
e se nutrir de lembranças,
assim como o leito dos rios
precisa da água que rola
e o coração necessita de afeto.

não faças do amanhã
o sinônimo de nunca,
nem o ontem te seja o mesmo
que nunca mais.
teus passos ficaram.
olhes para trás...
mas vá em frente
pois há muitos que precisam
que chegues para poderem seguir-te.

charles.chaplin

terça-feira, 9 de novembro de 2010

o médico, o monstro e o vazio de estar aqui.

ele vinha sempre tão despreocupado, tão cheio de vida, tão cheio de graça.
ele vinha sempre, de qualquer maneira, e qualquer besteira era riso solto.
ele vinha e tinha um sorriso largo, um abraço puro que me apaziguava.
ele vinha há tempos me fazendo rir, me fazendo leve, me fazendo crer.

que era crescente.

ele vinha sempre tão escandaloso, tão cheio da vida, farejando a caça.
ele vinha sempre se sacrificando e qualquer bobeira era grito alto.
ele vinha e tinha uma frieza insana, um olhar distante que me corroia.
ele vinha há tempos me fazendo mal, me fazendo muda, me fazendo crer.

que era pungente.


ele vinha sempre,
ele não vem mais.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

nossa sorte nesta guerra

não chore, meu amor,
nesta data querida.

20 e poucos

você já sabe
me conhece muito bem
eu sou capaz de ir
(e vou)
muito mais além
do que você imagina

eu não desisto assim tão fácil, meu amor,
das coisas que eu quero fazer e ainda não fiz

na vida tudo tem seu preço, seu valor
e o que eu quero dessa vida é ser feliz
e eu não abro mão...

nem por você, nem por ninguém
eu me desfaço dos meus planos
quero saber bem mais que os meus vinte e poucos anos

tem gente ainda me esperando pra contar
as novidades que eu já canso de saber
e eu sei, também tem gente me enganando
mas que bobagem, já é tempo de crescer
eu não abro mão...

nem por você nem por ninguém
eu me desfaço dos meus planos
quero saber bem mais que os meus vinte e poucos anos

oração

peço-te o prazer legítimo
e o movimento preciso
tempo, tempo, tempo, tempo...
quando o tempo for propício
tempo, tempo, tempo, tempo...

de modo que o meu espírito
ganhe um brilho definido
tempo, tempo, tempo, tempo...
e eu espalhe benefícios.


.caetano, o veloso.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

mamãe-quero-transgredir

eu sempre odiei video arte.
talvez esta seja a pior maneira de começar um trabalho sobre o tema, mas, tratando-se de uma temática tão transgressora, quem se importa?
este texto, escrito diretamente na caixa de "novas postangens" deste blog, nada mais é que uma resenha que preciso entregar nesta sexta, dia 1, para o professor r. e.
r. e. não é um professor tacanho e, por isso mesmo, me sinto à vontade para continuar.
esta entrega poderia estar em tal formato apenas para manter o caráter transgressor já citado, ou por vaidade minha, mas me pareceu mais ecologicamente correta.
a resenha é sobre o texto "made in brazil", do arlindo machado.
matenho o tom despojado encontrado no texto lido, e a liberdade opinativa de uma resenha.
enfim, eu odeio video arte.
para mim sempre esteve relacionado com algo nonsense, sem graça, sem objetivo, casual e, por vezes, irritante.
qual não foi meu desespero em descobrir que as aulas da disciplina "novas tecnologias em rádio e tv" tornariam-se longas sessões de video-arte.
talvez eu devesse deixar este comentário de lado, mas é mais emocionante assim.
bom, uma vez envolvida nisso, vamos pensar sobre isso.
o texto começa com uma afirmação cretina: o autor assume admirar mais o chacrinha que o maiakovski, os rolling stones e o caetano veloso...juntos.
eu chego a perder a noção se esse estilo admito-mesmo-e-daí? é genuíno.
ok, continuo.
na sequência arlindo machado conta, de modo semi-divertido, como surgiu a tvdo (lê-se tvtudo).
apesar da boa leitura e da identificação com as dificuldades relatadas, o texto acaba por resumir de modo assumidamente prepotente (e usando desnecessariamente a palavra "iconoclasta" 2 vezes em apenas 6 páginas) a ascenção dos membros fundadores da tal tv.
o autor conta com entusiasmo pedante como 4 jovens alunos da usp (incluindo ele mesmo, é claro) "revolucionaram" a maneira de fazer video, em um brasil em-plena-ditadura.
lembrando sempre que ele prefere chacrinha à caetano.
pausa. um comentário: caetano, hoje, se acha um semi-deus, e não o é. mas, convenhamos, o cara foi da tropicália, e o chacrinha era o circo de um povo sem pão.
uma passagem, enfim, que realmente me chamou à atenção, foi a conclusão do autor de que a desinformação em relação à video arte norte-americana permitiu que os artistas brasileiros tivessem uma autonomia de linguagem. tá aí algo que realmente faz sentido.
sem referência a criação é mais orgânica.
talvez seja esse o defeito da minha tv.
mesmo criticando, e acredito que isso seja parte visceral no direito de criticar, entendo o valor dado a estas obras experimentais, e as novas possibilidades que elas criaram para a verdadeira arte poder se expressar.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

amar.ula, amar.etto

a enlouquente apreciadora de licores fitava, por entre a pele, os músculos, a gordura e a placenta, aqueles olhos azuis açucarados.
meu deus! e se não fossem azuis?
mas é claro que seriam azuis.
a barriga da nora nunca estivera tão grávida.
não seria um absurdo dizer que estava verde de grávida.
tremendo de grávida.
explodindo de grávida.
e não havia frangélico que negasse isso.
ela seria avó dentro de poucos dias e isso era emoção demais para um tacinha só.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

sistema nervoso - versão imperativa categórica

questiona tanto quanto quiseres, e sobre o que quiseres, mas obedeça.



.immanuel.kant.

sistema nervoso - versão transgressiva

o povo unido sempre sai ferido de algum jeito.

e você insiste que o sistema é cruel e escraviza o nosso povo...

te cuida, meu filho, não deixe o sistema nervoso.



[pelo @matheustorreao ]

[purple]

saudades da gente, pudim.
saudades de mim.
há tempos não me sentia inspirada.
as rimas nem são propositais e, no entanto, vêm.
tenho medo que isso se perca pelo travesseiro.
seria uma pena.
gosto da leveza de achar que seria apenas uma pena, e não uma catástrofe.
nem tudo é uma catástrofe, afinal.
me prefiro assim.
tiro mais das pessoas, e dou mais de mim.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

quinta-feira, 29 de julho de 2010

noética

minha cabeça anda manca
arrasta, piedosamente, os pensamentos mal formados
enquanto apoia-se em mentiras

quinta-feira, 22 de julho de 2010

unisex

ele gosta de garotos, de preferência mais baixos que ele.
ele lê allan poe, augusto dos anjos e goethe.
clarice é ele.
em seu magro tronco correm estreitos varais poéticos , onde ele estende seus sentimentos mais soberbos e ali os abandona , para que sequem.
ele desafina seu tom para que o mundo o compreenda, mas sua guitarra, já mundana, não liga para tais burocracias.
led zeppelin, pink floyd, ac/dc.
cássia é ele.
ele admira trevor brown pela fina perversidade, e magritte pela genialidade nonsense.
ele filosofa no sofá como quem espera o coelho branco.
alice é ele.
seu drama cotidiano, hora cômico, hora cult, tem enredo ritmado e roteiro escrito por inúmeros punhos. e seu fabuloso destino, parece não chegar.
amélie é ele.
seu grafite, feito agulha, marca a pele e a alma. e é em forma de arte que é carregado nas costas alheias.
eu também sou ele.


> meados de 2007

direto de 2007

a saudade come
a parca alma que me resta
feito traça ingênua
sem culpa, sem pressa
que não sabe o valor do alimento

sábado, 26 de junho de 2010

.lp é lígia paiva

curiosa nossa vida de hoje, parece que não terminei, de fato, de ler um livro, enquanto não transcrevo tudo que grifei no papel para a tela do skoob. como se eu devesse satisfação, precisasse provar que realmente li, ou ainda, me agarrasse na esperança de que, transcrevendo e publicando para o mundo aquilo que me resume, aumentariam as chances de alguém ler e, consequentemente, eu existiria por mais tempo.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

.mulherices

eu perco a pose com facilidade.
minha maquiagem é vagabunda, o pé não sustenta o salto,
e acho específico demais usar um sutiã 42A.
42A. 42 nas costas, 40 no bojo.
só descobri isso ano passado.
não sei ser mulher.
é engraçado o tamanho do que cobre o nosso tamanho.
nostalgia de alfaiates.
meu all star é 38. qualquer outro sapato é 39.
a vida toda tive vergonha de calçar 39.
não tenho mais.

terça-feira, 11 de maio de 2010

via

que culpa tem o negro cão se a estrada invadiu a colina na qual ele corria?
para o cão, a colina será sempre colina, ainda que coberta de asfalto e salpicada de automóveis.
o cão corre, camuflado pela sombra que a lua nova emana.
o carro corre, como fuzileiro assustado, na corda bamba da estrada.
ao alcançar o asfalto, o cão é descoberto pelos olhos mecânicos do fuzileiro.
o pára-choque encontra o dorso do animal e, como se pedissem desculpa pelo descuido, ambos cedem.
que culpa tem o negro cão se a estrada invadiu a colina na qual ele corria?

quarta-feira, 28 de abril de 2010

some say april's the cruelest

"por que não? por que me afastar assim, gata?"

- eu prefiro que você me veja sempre assim: bonita, maquiada, me divertindo ao tomar cerveja com você e amigos. de jeito nenhum eu gostaria que a imagem de uma pessoa divertida sumisse aos poucos com as oscilações de humor, crises de choro, tpm, o gosto ruim na boca de manhã, a cara de acabada depois de uma noite mal dormida…

"mas essas coisas fazem parte de você!"

- pois é; a barganha é essa: metade ou nada.

[e por dentro, ela pensava: escolha a metade, por favor]



.escrito por Bea - http://quarentaetresporesdesol.blogsome.com/ .

segunda-feira, 26 de abril de 2010

sexta-feira, 23 de abril de 2010

o menino que eu não amo

o menino que eu não amo escreve bem. e escreve muito.
nunca escreve muito bem. mas quem de nós consegue fazer isso ao final das contas?
ele escreve, e isso já é bastante interessante.
o menino que eu não amo penso que não me ama também.
então tudo bem.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

aquilo que óbviamente não presta

eu tenho cara de bicho papão.
pareço um enigma e sou tão típica.
me agradar é a coisa mais simples do mundo e ninguém consegue.
eu gosto dos desgraçados, dos sofrimentos visíveis.
do mendigo, do aleijado, da puta por profissão.
desses que sem dizer nada, dão um tapa na cara do meu sofrimento burguês.

canalha

seria melhor não escrever do que usar a desculpa da ficção quando falho na vida. responsabilizar-me por cada uma das palavras, conhecendo de antemão quantos gramas pesa na língua.
não dizer o que não acredito, não comprar no idioma o que não preciso, não invejar o que não tenho.
(...)
até eu me apaixonaria por mim se não me conhecesse. mas vivo desmarcando encontros comigo. se eu for chato, insistente, vaidoso, ambicioso? como dar o fora em mim?
sou incompetente para tanta coisa, que muitas vezes nem começo para não entregar minha incompetência.
é mais fácil perdoar um escritor – ele se defende com folga, é articulado, inverte os papéis, mas não significa que não cometeu erros da mesma forma daquele que não tem palavras.
peço desculpas por pensar que a literatura é suficiente; não é, nunca vai ser; uma noite saímos dela e não teremos exemplares para nos justificar e não teremos leitores para nos confortar e seremos tão-somente o que vivemos, o magro pão dormido e a manteiga do sol.
terei que sair do livro e esperá-la do outro lado da rua. terei que ser mais do que uma frase bonita e um par de mãos para esconder sua fragilidade. terei que ser verdadeiro.

.carpinejar.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

no braseiro

quero justiça, alegria e quero paz,
mas com direitos iguais, como já disse tosh
e quero mais que um milhão de amigos do rc
como luís e su, as maravilhas do mundo quero comer
quero me esconder debaixo da saia da minha amada
como martinho da vila, em ancestral batucada
eu quero é botar meu bloco na rua, qual sampaio
quero o sossego de tim maia, olhando um céu azul de maio
eu quero é mel, como cantou melodia
quero enrolar-me em teus cabelos
como disse wando à moça um dia
quero ficar no teu corpo, como chico em tatuagem
e quero morrer com os bambas de ataulfo bem mais tarde
só que bem mais tarde...

eu quero ir pra ver irene rir, como escreveu veloso.

segunda-feira, 22 de março de 2010

vazio interior

eu devorava livros e mais livros na singela ilusão de rechear com as emoções dos outros o espaço das emoções que me faltavam.

m. pinsky

segunda-feira, 15 de março de 2010

das armas que me afligem

essas garotas do peito grande e da cintura fina sempre me intimidaram.

[esperando o dia em que a inteligência preencha meu decote.]

quarta-feira, 10 de março de 2010

sábado, 6 de março de 2010

millôr

não, não espero o ótimo, nem mesmo o melhor.
esse daí é bom? me dá esse mesmo!

segunda-feira, 1 de março de 2010

tudo que é sólido pode derreter

tu que já foste a rainha do nilo
a imperatriz do nailon
a duquesa da beleza
a sufragista
luz acesa na caverna iluminista
tu que já posaste para capa de revista
e guerreaste ativista
lider sindicalista
que já te provaste ensaista
contista, romancista
roqueira, feiticeira
tu que já foste a primeira
a síntese de uma espécie inteira
que fazes agora
nessa banheira?

natalia.mallo

domingo, 28 de fevereiro de 2010

distimia

antes fosse uma tempestade,
com trovões e chuva forte,
mas não, é só um dia cinzento, aliás,
são todos os dias cinzentos: sete segundas feiras por semana...

eduardo.lopes

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

sim, estamos escutando.

ela pisava, descalça, pelas amoras do parque.
havia uma fina diferença entre pisoteá-las assim,
ou com o velho all star.
o tênis espalharia a fruta pelo chão, quase sem propósito,
sujando-se em ato de sutil arrogância.
o pé não.
o pé é quase tão vítima e amante quanto a fruta.
a fruta massageia o pé, o pé entrega-se ao sumo.
a terra aprova.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

demian

mas cada homem não é apenas ele mesmo;
é também um ponto único, singularíssimo,
sempre importante e peculiar,
no qual os fenômenos do mundo se cruzam daquela forma
uma só vez e nunca mais.

hermann.hesse

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

domingo, 31 de janeiro de 2010

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

alucinação

eu não estou interessado
em nenhuma teoria
em nenhuma fantasia
nem no algo mais

nem em tinta pro meu rosto
ou oba oba, ou melodia
para acompanhar bocejos
sonhos matinais...

eu não estou interessado
em nenhuma teoria
nem nessas coisas do oriente
romances astrais

a minha alucinação é suportar o dia-a-dia
e meu delírio é a experiência
com coisas reais...

um preto, um pobre
uma estudante, uma mulher sozinha
blue jeans e motocicletas
pessoas cinzas normais

garotas dentro da noite
revólver: cheira cachorro
os humilhados do parque
com os seus jornais...

carneiros, mesa, trabalho
meu corpo que cai do oitavo andar
e a solidão das pessoas
dessas capitais

a violência da noite
o movimento do tráfego
um rapaz delicado e alegre
que canta e requebra
é demais!...

cravos, espinhas no rosto
rock, hot dog
"play it cool, baby"
doze jovens coloridos
dois policiais

cumprindo o seu duro dever
e defendendo o seu amor
e nossa vida

mas eu não estou interessado
em nenhuma teoria
em nenhuma fantasia
nem no algo mais
longe o profeta do terror
que a laranja mecânica anuncia

amar e mudar as coisas
me interessa mais...

.belchior.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

uma sombra passou por aqui

continuava a chuva.
chuva forte, perpétua, suada, fumegante, garoa,
aguaceiro, fonte, enxugar de olhos, sucção de tornozelos,
chuva para afogar todas as chuvas e a recordação das chuvas.

ray.bradbury

sábado, 23 de janeiro de 2010

damasco

foi hoje de manhã.
quando abri um iogurte de damasco. daqueles com pedaços inidentificáveis de fruta.
coloquei o pote sobre a pia e joguei a tampinha de metal no lixo reciclável.
olhei pro potinho.
eu sempre tive nojo de pias.
meu pai costumava limpar lulas nela quando eu era criança e eu ainda vejo as tripas espalhadas pelo mármore.
é o tipo de coisa que nem álcool e fogo consegue limpar.
senti inveja do potinho de iogurte.
uma inveja absurda por ele ser de plástico e, óbviamente, mais resistente ao tempo do que eu.
imaginei uma mórbida corrida pútrida entre o meu cadáver e o potinho.
o potinho venceria. não havia dúvida.
eu estava tão vulnerável...
aos 36 anos, numa batalha infinita contra nunca-saberemos-o-que, ela começou a chorar no meu sofá.
servi-lhe café, desejando secretamente que a cena acabasse logo.
ela era geniosa, certamente, mas perdera-se na angústia de fazer escolhas não-convencionais.
agora estava aí, com inveja de um potinho plástico, o que seria poeticamente gracioso, salvo o fatigar de suas crises metafóricas.
continuou a chorar, pulando de um assunto para outro e tentando, sem muito sucesso, amenizar a própria situação.
eu mesmo comecei a ter inveja do potinho de iogurte.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

alforria profana

se me afagas demente
do alto de teu sono latente, nesmeyana
é pra depois a vida ter valor

se passivo deleito e cultivo
nesta espera insana
uma tal simpatia pela dor
é sabendo que vivo
como quem flana
satisfeito
pelo impossível
hora ironia, hora esplendor

um olho me guia
tangível a tudo que emana
o outro
inatingível
inebria o sentido
alforria profana
e tateia teu timbre
e degusta o olor

se teu ser aldrúbio
desencadeia nostalgia
e cativa
o meu olho transgressor
ao sóbrio nada suscita
mas como o olhar me é dúbio
é com essa vista bendita
que sigo na expectativa
hora euforia, hora torpor

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

o gênio ocioso

hoje sinto orgulho que dizer que sou inumano,
que não pertenço a homens e governos,
que nada tenho a ver com a maquinaria rangente da humanidade
– eu pertenço à terra!

henry.miller

domingo, 17 de janeiro de 2010

esta noite o rei não dorme

si pudieses liberarte, por una vez, de ti mismo
el secreto de los secretos se abriría a ti.
el rostro de lo desconocido, oculto más allá del universo,
aparecería en el espejo de tu percepción.

en realidad, tu alma y la mía son lo mismo.
aparecemos y desaparecemos el uno con el otro.
este es el verdadero significado de nuestras relaciones.
entre nosotros, ya no hay ni tú ni yo.

.rumi.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

puro extrato de sebo

- whisky tem gosto de livro velho.

- discordo. se o livro é bom, a velhice só lhe aumenta o charme.
whisky tem gosto de cheiro de livro velho.

das faltas

se o teu amor despreza os sinais do amor
a pretexto de atingir a essência,
o teu amor não passa de um palavreado.
não descuides das felicitações,
nem dos presentes,
nem dos testemunhos.

antoine.de.saint-exupéry

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

dessas novas formas de conversar

é horrível isso.
um silêncio que tem cor.
e é branco.
que, por pura ironia, é todas as cores.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

ato falho

- não vem ao acaso.
ou melhor, não vem ao caso.
ao acaso pode até vir.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

a noite é grande e cabe todos nós

é inútil fazer a nossa beleza.
ela é uma descoberta do nosso próximo.
aqui está, por exemplo, uma flor.
não fez nada para que eu a achasse bela.
fui eu que senti a combinação do seu silêncio
com o esmaecimento de seu vermelho.
fui eu que descobri elegância
na inclinação do seu caule para a direita.

antônio.maria

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

inlakesh alaken

2010 atropelou a contagem regressiva e chegou antes.
invasivo, efusivo. chegou e é isso.
idependente de rituais, pedidos e promessas.
já está aqui e lide com isso.
do outro lado da partícula a gente inventa o tempo.
mas deste lado tem regras demais.
a falta de regra não é falta de ordem.
pode ser a presença mais pura desta.
a ordem não-burocrática, libertária e libertina, é consciência.
é elevação. é entendimento.
o ofício sem obrigação, punição ou autoritarismo, é artifício.
explode docemente, instintivamente, sobre tudo.
a extinção da hipocrisia faz milagres.
a recompensa vem de dentro.
a abstração do pormenor, a abstração da posse, daquilo que só o olho vê.
aqui se olha no olho e a vida segue mais.