quinta-feira, 6 de novembro de 2008

linhas tênues

era gorda. estava muito longe da obesidade, mas era gorda.
carregava unhas âmbar nas mãos e vemelho tomate nos pés.
vestia uma blusa de pano leve, muito larga, quase brilhante e com estampa de leopardo.
descia pelas pernas, até a tornozeleira, uma legging preta.
levava brincos típicos de 25 de março, prateados, assim como o relógio, e uma grande bolsa marrom com detalhes dourados.
tal tipo, muito mais comum do que possa parecer, nunca havia me chamado alguma atenção maior que um julgamento instantâneo sobre vestimentas inadequadas.
mas ela me chamou atenção.
me chamou atenção pelo que estava fazendo:
nas mãos, uma embalagem de prestígio era enrolada com toda cautela.
o nariz torto fitava o rolinho.
desenrolou.
começou a enrolar de novo, agora pelo lado aberto da embalagem.
desenrolou de novo.
enrolou com o lado de trás para a cima.
e assim seguiu nessa mistura de t.o.c., terapia ocupacional e fascinação.

3 comentários:

AmoraLia disse...

noussa....25 d emarço pavooooooooora!!

Grazi. disse...

cara, pelos detalhes que vc descreve as pessoas, dá impressão que vc passa horas sentada em plena estação da sé esperando um figura dessa passar, anotando cada detalhe num caderninho.
tipo uma detetive anônima dos anônimos, sabe?
;D

.lp. disse...

na verdade, normamente eu observo por um tempo muito restrito. De cinco minutos em um metrô lotado à alguns instantes pela janela do ônibus.
as anotações são mentais e, embora fatos raramente sejam inventados, há muito de romantismo nas descrições em si.